Maracanã

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sábado, 21 de fevereiro de 2009

Oh abre alas...que eu quero passar...


Oh abre alas...que eu quero passar...


Minha gente, olha o carnaval aí...grita o sedutor puxador de samba, no meio da concentração. E, meninas e meninos, tratem de se concentrar, consertar, compenetrar que foi dada a partida para o desfile. Fogos. Televisões em polvorosa, fotógrafos se acotovelando, gritarias, alguns desmaios, chiliques e pitis, homarada indócil pra olhar a mulherada inquieta, siliconada e com quilos de maquiagem, mais uns pesos em paetês, plumas ( que não pesam nada) e uns saltos que devem pesar até as consciências...

Como elas conseguem tanto equilíbrio nessas geringonças que lhes sobem pelas panturrilhas como lagartichas empesteadas de strasses? A cada ala, abre por favor, que vai passar...a mocidade independente, a velhice libertária, a velha guarda , a jovem e a moderada... passará muita bateria de todas as bandas, de cá e de lá, os gays explodirão sua contagiante sede de viver, no colorido mais divinamente aplicado à passarela do samba.

Que samba? samba quem pode, obedece quem tem juízo, corre quem consegue, canta quem sabe a letra, abre os braços quem se desvencilha dos adereços, e se empertiga quem treina carregar o explendor. Põe explendor nisso...que festa...inigualável, principalmente se levarmos em conta as descrições e entrevistas dos repórteres globais, atentos ou desatentos, informantes ou desinformantes, chovedores do molhado ou alienados à história dos enredos intrincados de carnavalescos zombadores da vida, verdadeiros caricaturistas das verdades de quem conta um conto e aumenta um ponto.

Lá vai ela, a escola do coração de todos nós. Tem a da comunidade, a do morro do bairro vizinho, a da estação suburbana que me traz a memória infantil das ruas e folguedos, o velho Pixinga de pijama listrado tomando cerveja no bar da esquina. Ah, abre por favor, mais alas, que eu quero passar com a minha saudade daquele carnaval da Presidente Vargas, quando vi o samba atravessar e o compositor portelense chorar como criança, um Paulinho da viola ainda quase menino, mas o sentimento , naquela chuva toda, era de um sofrimento sincero.

Eta povo bom esse, que chora por um samba atravessado. E eu vou passando, entre carros alegóricos, minha alma canta , vejo o Rio de Janeiro, tem gente saindo pelo ladrão, entupido o tal sambódromo, modernoso e altivo, e o carnaval se faz entre o Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Recife, as televisões vão apresentando um pouco de cada lugar, mas os carnavalescos que se prezam já saíram no cordão do Bola Preta, na abertura de sábado, e agora, se gabam com as proezas das comissões de frente, de trás dos muros da fantasia, onde mora o sonho de grandeza da gente pobre e da gente rica em imaginação e vida cheia de alegria.


Minha nossa, lá vem ela , a Chiquinha Gonzaga, ninguém viu? mas eu sei que era ela sim, sorridente, passeante entre as passistas, rindo de si mesma, do seu pioneirismo feminino em termos de festa popular, de chorinhos chorados, cortando as jacas que devem ter sido comidas pela fome de felicidade, que ela nos legou, como herança e conteúdo.

Tem de tudo, sim, na folia e nos dias de reinado momesco, arabesco nas saias das baianas, refresco pros olhos dos senhores, as jovens arrumadinhas, musculatura perfeita, rainhas das baterias, as senhoras também, com seu direito adquirido, após anos de malhação, arrumação, plstificação, ficação nas lembranças dos velhos e novos carnavais. Abram alas, please, ajudem a carregar o estandarte da verdadeira magia.

Aí vamos nós, vou eu e vão vocês, rumo ao mundo do faz de conta. Tem reis, rainhas, fadas, ursos de pelúcia, aves, índios, figuras espanholas e portuguesas, um enxame de personagens infantis e uma plêiade de criaturas nunca dantes navegadas, assim , do nada, aparecem aos nossos olhos, em situações incrivelmente inusitadas, abrem leques, saem de geladeiras, simulam sexo, nascimentos, imploram justiça ou esbanjam enamoramento, são mestres nas salas e nos quartos, nas almas e nos corações, portas-bandeiras, seres de saias que rodam enquanto nossas cabeças se confundem, tudo tão espetacular.

Abre, querido, um espaço para que eu passe por aí, por seu andamento cadenciado de coração a bater por mim, até. Abre, sim , minha amiga perdida na multidão, abre quantas alas for possível abrir, nem titubeie, apenas se incendeie. Amanhã, já será outro dia, e este carnaval de agora, será só mais um em nossa história. Sendo assim, canta comigo o refrão, sambe com a força das pernas, e o rebolado das ancas, arregace os braços, abra a boca, expanda o ar, solte dos pulmões toda a grandeza de fazer parte desta ópera popular brasileira chamada carnaval...

Aparecida Torneros

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