Maracanã

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sábado, 21 de novembro de 2009

vanessa Paradis " Emmenez-moi "



Leve-me, eu pedi ao Vento


Maaaaryyyyyyyy...a menina ouvia o Vento zunindo lá fora parecendo chamá-la... o Vento de agosto, na cidade tropical, quando sua magreza adolescente lhe deixava ver as pontas dos ossos dos quadris e ela até se divertia e tocá-los, descobrindo que no seu esqueleto morava quase a essência dela, pensava... Mas, a poesia lhe começava a coçar os miolos, era preciso responder ao Vento, aquele senhor enfurecido e louco que carregava as folhas, derrubava as árvores, metia medo, assustava quem não duvidasse da sua força. Mary pegou papel e lápis, deitou-se de bruços no chão encerado da sala antiga e escreveu:


- Vamos Vento, sopra forte


que eu aguento a minha sorte...


E foi por aí..compôs um poema premunitório, do quanto a vida lhe seria como um vendaval levando-a em sonhos e em realidade a tantos confins... Passaram-se décadas, a pequenina Mary amadureceu levada por ventos ora calmos, ora tempestuosos, mas sobreviveu com um sorriso insistente, com olhos calmos diante das intempéries, com esperanças renovadas e uma selvagem capacidade de recomeçar a cada terra arrazada, depois de toda e qualquer destruição dos seus castelos.


Mary descobriu então as músicas de Charles Aznavour, ela teria uns vinte e tantos anos quando se apaixonou pela obra do artista e passou a ouvir insistentemente suas canções... Emmenez-Moi parecia traduzir exatamente seus sentidos... Era a expressão do que lhe passava sempre. Deixar-se carregar pelo vento da vida, indo ao encontro de lugares ensolarados onde a miséria fosse diluída pela alegria de viver, além de todos os problemas, tensões, além das tristezas que podiam ser diminuídas pela certeza de que tudo passa, passou ou vai passar um dia...


Mary chegou bem perto da janela, olhou a cidade que amanhecia e o sol que depontava. Sabia que bem longe dali alguém a levava como o Vento, para viver seus sonhos em comum, ainda que não passassem de sonhos, mas eram o prenúncio de felicidades inesquecíveis, as mesmas que a faziam chorar emocionada agora, lembrando da menina magricela que um dia deixou que o vento a carregasse pelo tempo, lhe mostrasse até o amor, lhe roubasse o sono, lhe despertasse dos pesadelos, lhe recuperasse a paz interior, lhe oferecesse colo, lhe acalmasse as dores, lhe desse um lugar seguro, para que sua alma viajante ancorasse agora, nesta manhã que despontava em seus sentidos, tão calorosa quanto restauradora, um segredo justo entre Mary e Deus, pelo qual a senhora confortada em suas emoções, podia sim, agradecer e manter a inviolabilidade do seu conteúdo.


Jamais, a doce Mary revelaria o mistério que a ligava ao mundo dos homens, sabia que este mundo era muito pequeno diante dos paraísos que a eternidade lhe resevava...Portanto, mais uma vez, Mary cantou...emmenez-moi...pedindo ao Vento que a levasse no seu destino, com encantamento e glória...o vento de dezembro estava para chegar... traria o espírito de Natal, ela reviveria, ia renascer, sabia disso, agora, tinha certeza...


Cida Torneros

Tradução...português



Leve-me


Em direção às docas, onde o peso e o tédio


me curvam as costas


Eles chegam, pesados de frutas,


os navios

Eles vêm do fim do mundo,


trazendo com eles idéias nômades


Nos reflexos do céu azul, miragens


Atrás de si, uma fragrância apimentada


de países desconhecidos


e eternos verões


Lugares onde se vive quase nu


pelas praias

Eu que, em toda minha vida,


não conheci mais do que o céu nórdico


Quero lavar esse cinza,


mudando de rumo

Leve-me até os confins da terra


Leve-me ao país das maravilhas


Me parece que a pobreza


Seria menos dolorosa quando se está sob o sol

os bares, ao cair da tarde,


com os marinheiros


Quando falamos de amor, de garotas,


um copo na mão


Perco a noção das coisas


e de repente meus pensamentos me levam até


um verão maravilhoso


Onde vejo, braços servis, o amor que,


como louco, corre diante de mim


E enlaço meu sonho,


com os braços em volta do pescoço

Quando o bar fecha,


Quando os marinheiros se unem, de volta ao seu rumo


Eu permaneço sonhando, até de manhã


De prontidão no cais


Leve-me até os confins da terra


Leve-me ao país das maravilhas


Me parece que a pobreza


Seria menos dolorosa quando se está sob o sol


Algum belo dia, num raffiot (tipo de embarcação)


fissurado, do casco à cabine de comando


Para partir trabalharei nos depósitos de carvão

Tomando o caminho que me levará


aos meus sonhos de criança


A ilhas distantes onde nada mais importa


além de viver


Onde garotas esguias são um deleite ao coração,


me disseram, com seus colares de tramas de flores,


inebriantes


Eu fugiria, deixando meu passado


Sem nenhum remorso,


Sem bagagem e de coração livre


Cantando bem alto


Leve-me até os confins da terra


Leve-me ao país das maravilhas


Me parece que a pobreza


Seria menos dolorosa quando se está sob o sol

Leve-me até os confins da terra


Leve-me ao país das maravilhas


Me parece que a pobreza

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