Maracanã

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domingo, 15 de novembro de 2009

Amor desidealizado



Amor desidealizado




Façamos um trato,


nada de amor idealizado,


este é o novo fato,


amor é só um ato


de uma grande peça


cuja estréia é imprevisível


cujo enredo é questionável,


e o ápice tem interrogações à bessa...


Façamos assim, com respeito,


pelo jeito de cada um de nós,


pelas histórias incompletas,


pelos desejos não realizados,


por cada senão que precede as metas,


porque amar com muito planejamento


pode parecer piegas, é só argumento...


Nada de esperar o óbvio ou antever o amanhã,


por mais que possa parecer que haverá,


depois não me importa, na verdade,


o que conta, realmente, é o momento...


O meu momento é de paz,


o seu, se não for de tormento,


pode até combinar com o meu...


Façamos amor como meninos aprendizes,


saboreemos o gosto dos nossos dedos,


não deixemos que se acelerem alguns dos nossos medos,


apenas soltemos tantos grilhões tão antigos,


não esperemos nem príncipes e nem cinderelas,


somos mulher e homem complicados


descompliquemos, pois,


fiquemos só nós dois,


em pelo,


com zelo,


tão nus quanto no nascimento


nus de alma,


nus de preconceitos


nus de expectativas...


Se nada acontecer que nos acrescente sentimentos


caso não nos permitamos abrir nossos descondicionamentos


pelo menos


teremos tentado


e tentar


já é um grande começo


isso não tem preço


amar sem idealizar


somente amar


ou por sexo


ou por nexo


de sentir-se


bem


bem melhor


bem com a presença do outro


bem porque sua risada soa felicidade


bem poquer seu olhar aquece em lealdade


e seu abraço rejuvenesce


pode não ser pra sempre


mas é tão bom


hoje e agora, aqui na nossa pele...


Façamos um acordo sem papel


um pacto sem sangue


tenhamos um descompromissado encontro


com o melhor de nós mesmos


para trocar boa energia


por sermos quem somos


livres e resolvidos


inteiros e destemidos


vamos evoluindo


um junto do outro


até quando for possível,


quando for tão forte e tiver sentido


nos vermos mais vezes


ou nos tocarmos mais profundamente


ou nos entregarmos nossas mãos


uma dentro da outra


e nossas bocas


perderem o dom da palavra


para que nossos corpos e almas


falem sua própria linguagem...


Façamos uma boa parceria


sem cláusual pétrea


revogável


a qualquer instante...


aí... tenhamos sorte...


disso sim,


vamos precisar...


e se a tivermos,


façamos um castelo


sem sonhos


mas com realidades


minhas e suas


sei que eu o quero


tanto quanto você me quer,


recomecemos do zero,


e seja o que o Diabo quiser...


Cida Torneros , 8 de junho de 2008



Jurandir Freire Costa

Amor é uma palavra com muitos sentidos. Falamos de amor aos pais, aos filhos, a Deus, à pátria, ao próximo, à causa etc. Vamos reter, dessas acepções, a de amor como sinônimo de "amor erótico".


Amor erótico ou amor-paixão romântico é um complexo emocional formado por sensações, sentimentos, crenças e julgamentos. Saber o que é amor é poder reconhecer, em si ou nos outros, sensações físicas ou mentais de um tipo específico; atitudes ou disposições para com o objeto amado chamadas de sentimentos; convicções sobre a natureza do objeto amado e do amante e, por fim, julgamentos sobre o valor do amor, isto é, sobre sua bondade, sua beleza ou sua necessária participação na felicidade e no equilíbrio psicológico do indivíduo.


O amor erótico, portanto, não é apenas uma atração sexual acompanhada de sentimentos ternos (enlevo, carinho, preocupação, cuidado, dedicação, devoção etc.) ou violentos (desejos de posse exclusiva, ciúmes, desconfianças, rivalidades etc.). Pensar no amor dessa maneira já faz parte do aprendizado amoroso, pois significa estar convencido de que ele foi sempre o que é hoje, ou seja, uma emoção sem memória e sem história.


O amor romântico, entretanto, é uma emoção recente na história ocidental. Sua gênese é indissociável do enorme enriquecimento da esfera da vida íntima, da repressão à sexualidade e, por fim, da valorização moral da família nuclear e conjugal. Não é surpreendente, assim, que a liberalização da sexualidade, a ruptura com a tradição familiar e a diluição da intimidade na publicidade estejam mudando a face do amor.


Desidealização do amor


Até agora, o amor era um ideal de auto-realização afetiva que acenava para um tipo de felicidade no qual o êxtase da dissolução no outro era compatível com a consciência da individualização do desejo. Esse ideal, é óbvio, não correspondia à prática amorosa efetiva. Consciência de separação e êxtase fusional raramente andam juntos. Mesmo assim, o ideal se mantinha, pelo fato de incitar a realidade a se superar em direção à idealidade.


Atualmente, o amor vem sendo desidealizado e, em consequência, a realidade emocional parece privada daquilo que a empurrava para a auto-superação. Ora, na cultura individualista de nosso tempo, o amor romântico se tornou o reino do maravilhoso, do mágico, da vontade criativa que resistia aos assaltos da razão calculista, instrumental e utilitarista. No amor valia a regra das exceções que a emoção permite. Podíamos ser excessivos sem culpa, generosos sem temor, doadores avarentos, egoístas com boa consciência, rebeldes cientes do valor da transgressão, enfim, podíamos viver afetos ambivalentes e, ainda assim, estar psicologicamente satisfeitos.


Mas, já se disse, o hábito faz o monge. Novos mundos, novos sujeitos, novas emoções. No momento, estamos, pouco a pouco, aceitando que a experiência amorosa é fugaz e seu destino é a provisoriedade. Resta saber, portanto, para onde vai migrar a vontade de ir além do bom senso, o desafio de realizar o impossível ou o ímpeto de vencer a brevidade, em matéria de felicidade emocional. O amor romântico encarnava essas promessas. Em sua ausência, quem ou o que vai se ocupar do sentido da vida de cada dia ou da fantasia da redenção afetiva? Ainda o mesmo amor? Outras formas de amar? Ou outras maneiras de criar um mundo emocional sem a onipresença do romantismo? Difícil de responder; impossível não querer responder; a cada um a tarefa de procurar responder.


[1] Jornal Folha de São Paulo, Caderno Mais!, Milênio para Iniciantes - AMOR, 31 de dezembro de 2000. A convite do Mais!, especialistas discutem, de A de amor a Z de zoologia, 23 questões fundamentais para a humanidade a partir de 2001. Foto disponível originalmente no site www.imoon21.com/modern/sculpture/canova/canovaimg/amor.jpg
Aparecida Torneros

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