Maracanã

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sexta-feira, 1 de maio de 2009

Cida Torneros:a gripe e o dilema de ir a Paris




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CRÕNICA DE VIAGEM

Sonhando com beijos “epidêmicos” em Paris

Aparecida Torneros

“O acaso me pegou como um caso sério. Afinal, depois de ter sonhado por décadas com uma viagem à Europa, tudo praticamente pronto, a uma semana do embarque, as amigas telefonam e pensam em desistir por conta da epidemia da gripe “porquinha”. Logo agora, que entre os roteiros turísticos que programamos, além das idas a capitais de países ibéricos, cidades religiosas e terras galegas dos nossos ancestrais, eu somei os beijos parisienses, os chamados beijos prometidos… Como fazer para abrir mão dessa parte do alvoroço adolescente de que me vi tomada, nos mais recentes dias, imaginando as cenas, vislumbrando sensações de plenitude afetiva, para registrar quadros impressionistas inesquecíveis, aqueles em que as ruas da capital francesa seriam pano de fundo para beijos apaixonados?

Os argumentos das minhas companheiras de vida e viagem são plausíveis, centrados, afinal a pandemia da influenza suina ou A, como a querem rebatizar agora, nos coloca em situação à mercê do imponderável e imprevisível, nunca se sabe o que vem depois que a peste se instalar infectando os ares e as respirações de povos, adentrando por aeroportos e escondendo sorrisos atrás de máscaras de proteção. Uma delas me questiona: - Que graça teria essa viagem, asim, sempre com medo do que possa vir adiante, se fecham lugares públicos que pretendíamos visitar, se nos interrompem os passeios, se podem até nos impedir de sair de alguns lugares ou entrar em outros? Instala-se o pânico, vejo-me na idade média, sei lá, ou no início do século XX, quando minha avó contava que as carroças passavam nas ruas para recolher os cadáveres de vítimas da gripe espanhola. E não havia ainda o uso indiscriminado de antibióticos e nem a farmacologia tinha chegado aos patamares de sofisticação que alcançou atualmente. Porém, um mundo tão globalizado e em crise econômica, todo e qualquer procedimento que envolva a parada para pensar ou a matança de gente e de sonhos, tem uma aura de guerra sem estrelas, verdadeira batalha travada no inconsciente afetado pelo medo generalizado e por inimigos virais, passíveis de serem detectados em microscópios, passados por bocas, ai meu Deus, por bocas falantes, respirações ofegantes, sorrisos escondidos, talvez por mãos contaminadas, etc. etc.

E como ficarão os beijos em Paris? Adiados, descartados, esquecidos ou desistidos?
Difícil aceitar que vou acovardar-me diante de gripe emporcalhando vidas, e ainda por cima vou temer ser uma “Kamikase” dos melhores beijos “epidêmicos” que ainda quero provar em boca que me esperará em Paris. Nas próximas 24 horas, vou remoer pensamentos, resolver questões de medo e audácia, vou tentar convencer as amigas, vou rezar aos santos da Velha Europa para que me iluminem as idéias, e me mostrem que destino devo dar aos beijos “prometidos” e aos “sonhados”…

Já não posso permitir que eles fiquem eternamente “perdidos” por aí, pois, há uns anos atrás, um poema meu “procura-se beijo perdido em aeroporto”, deixou-me marca que custei a apagar. Logo agora, que reencontrei a chance de cantar como a Rosa Passos cantou magistralmente em Madri, um “Besame mucho”, carregado de latinidade abrasileirada e sutil, nem pensem os senhores de laboratórios onde se fabricam moléstias advindas de mutações virais, que vou permitir que injetem seus males nos meus “beijos desmacarados”.

Com máscaras de proteção fica impossível beijar e sentir o quanto lábios mornos e vivos são capazes de neutralizar medos e vírus. Minha Notre Dame, guardai nossos beijos, quer dizer , os meus, os dele, e os de todos que sonham com beijos assim, e, num milagre possível, rogai ao
Pai para que eu viaje, adentre sua Nave para agradecer a maravilhosa epidemia de beijos que testemunharei na face da Terra, apesar dos pesares, no mes das Nossas Senhoras, isso mesmo, num maio primaveril, de beijos em flor, pelos cantos de uma Paris que merecerei conhecer”.

Aparecida Torneros é jornalista e escritora carioca, autora de “A Mulher Necessária”.

Comentário no site Bahia em Pauta:

Regina on 1 May, 2009 at 14:33
# Ai que inveja!!! Paris e um amor enrustido que tenho e que me preparo para a entrega ha muitos anos. Se vc esta preparada, nao pense duas vezes, VA. O amor, os beijos e a loucura sobreviven as “pestes” do mumdo, sao muito mais poderosos!!!!!!

Um comentário:

Maria Tomasia disse...

Cidinha, morro de inveja, de verdade, porque uma viagem à Europa é um sonho que venho acalentando desde 1975 e até hoje não pude realizá-lo, ora por um motivo, ora por outro. As cidades religiosas então, nem se fala, a Itália dos Césares contra o Cristianismo, os lugares onde aconteceram as maiores barbaridades com aqueles que acreditavam em Cristo, Pompeia e os edifício que ainda hoje continuam de pé, descobertos depois das escavações, Nápoles e seu rico museu com as peças encontradas em Pompeia a Espanha e os "Tapas", suas Igrejas, sua arquitetura e museus, França e seus museus, parques, jardins, palácios, castelos e Portugal com sua gente simpática e acolhedora, além dos inúmeros monumentos, igrejas, museus que certamente nos fará sentir o cheiro do passado que tão bem conhecemos.
Mas, como acredito em sonhos e estou convicta de que enquanto sonhar continuarei viva, esperarei com tranquilidade a ocasião em que irei ver e conhecer a cultura do Velho Mundo. Disso estou certa!
Maria Tomasia Middendorf