Maracanã

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segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Os refugiados do Amor


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ARTIGO/COMPORTAMENTO
Os refugiados do amor…
Aparecida Torneros
Um bando de refugiados formou-se nos últimos tempos, buscando emigrar dos seus próprios sentimentos. É bem verdade que tiveram ajuda humanitária do modo de vida consumista, um anestesiante de ação efetiva, que os afasta da realidade, dando-lhes uma plena sensação de satisfação extemporânea, um estado de “nem quero mais pensar nisso que me aflige” ou aquela pitada de desfaçatez própria do cinismo aparente.
Os refugiados do amor, em constantes arroubos justificativos para o seu comportamento, apregoam aos quatro ventos que não estão nem aí para suas histórias afetivas profundas e seguem vivendo pequenos enredos sem laços mais fortes. Preferem provar dos amores descartáveis, os tais encontros de “ficantes”, sem vínculos comprobatórios, do tipo “não haverá amanhã”, que, segundo eles, os deixam à vontade, descompromissados, livres para voar, no seu dia-a-dia, ou melhor nas suas noites após noites.
Nada sabem esses fugitivos do amadurecimento que paira sob os olhares antigos de gente que cultiva um grande e sólido amor. Sequer conseguem redimensionar a felicidade de um beijo repetido cujo gosto varia de sabor, por décadas, entre pessoas que aprendem a incorporar seus parceiros como se fossem ares para sua respiração e que não se vêem no mundo sem as presenças de figuras que os complementam.
Casais assim, poderiam ser chamados de “os encontrantes”, cada vez mais rareados, mais escassos no sistema produtivo capitalista, pois não os junta nem a conta bancária, tampouco a ambição pelos bens de um ou de outro. O que os une é a alegria do aconchego, a paz do lado-a-lado, o sono acompanhado, as mãozinhas dadas, os olhares para a mesma direção do arco-íris que ilumina seu caminho comum.
Quanto aos refugiados do amor, sua legião cresce com as novas gerações, especializaram-se em sobreviver de encontros superficiais, casamentos-relâmpagos, viagens rápidas pelas paixões esquecíveis, e, o que é pior, desconstruíram em si mesmos o dom de iludir, sim, o melhor dos dons, o da ilusão a dois.
Sem o sonho do dia seguinte, sem a magia do futuro feliz, sem o nirvana do amor eterno, lá se vão os peregrinos do mundo moderno, de aeroportos em aeroportos, trocando de aeronaves, voando sobre suas próprias cabeças, certos do incerto, convencidos do exercício do supérfluo, anotando em suas agendas eletrônicas os nomes que logo serão deletados, num troca-troca alucinante, confusão de bocas, olhos, cheiros, quiçá de gostos misturados.
Em algum lugar do universo, encontrarão, quem saberá, o refúgio para um exílio seguro depois de tanta fuga. E aí, será que o amor volta? Será que seus corações reaquecidos poderão renascer em paixões que os arrefeçam? Melhor imaginar que suas almas serão sábias para conduzi-los ao lugar onde a fuga cesse, o abrigo do maior amor os acolha e a eternidade os faça acordar um dentro do outro, juntos, fiéis, e para sempre. Sem mais fugirem de si mesmos!
Aparecida Torneros, jornalista e escritora, mora no Rio de Janeiro, onde edita o Blog da Mulhar Necessária (http://blogdamulhernecessaria.blogspot.com).
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Comentários

Mariana Soares on 22 novembro, 2009 at 16:05 #
Falou e disse, Cida! Só quem vive um grande, recíproco e duradouro amor – um amor de verdade, quero dizer, um amor pelo amor e nada mais, sabe o quanto de satisfação, plenitude e alegria isto pode proporcionar, principalmente a nós mulheres, cujo cultivo do sentimento é o nosso maior combustível para tocar a vida.
Cida Torneros

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