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quinta-feira, 14 de abril de 2011



Cida Torneros: No Dia do Beijo uma beijoqueira desde menina fala da sensação que nunca sai de moda


Arquivado em ( Artigos) por vitor em 13-04-2011 20:17






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CRÔNICA






Beijo na boca, como viver sem ele?






Maria Aparecida Torneros






Sou daquelas pessoas beijoqueiras. Quando menina ( como centenas fazem) treinei muito beijando laranjas e maçãs tentando adivinhar o gosto de um futuro e prazeroso beijo na boca. Retive em mim alguns receios naturais, esperei o namorado do colégio, adiei muito e aos 17 anos, finalmente, provei da coisa ansiada, com um desajeitado sentimento de invadir e ser invadida no sorriso e na sensação de doce ou amargo, foi uma confusão.






Com o tempo, claro, esmerei-me na prática e os namoradinhos foram se sucedendo, descobri que cada ser humano beija do seu prórprio jeito e que há beijos despretenciosos e inocentes enquanto outros são provocantes e libidinosos. Os beijos de amor são identificados com o coração aos pulos, elevam-se à categoria do alerta vermelho, casamento ou sexo à vista, afinal, a carne é fraca, dizem todos por aí…


Atualizando meu vocabulário com os filhos adolescentes de amigas e amigos, incorporei o BV, boca virgem, quer dizer aquela pessoinha que ainda não beijou ninguém. Corre entre a meninada o estigma, Fulaninha é BV, coitadinha… rs…






Noutro dia, uma amiga viúva há uns poucos anos, me confessou que não abraça ou beija alguém desde que perdeu o marido, e o fez, num tom choramingado, saudoso, talvez porque o beijo que realmente lhe faz falta não é o de qualquer um, mas aquele do seu companheiro de tantos anos que partiu deixando-lhe a saudade da vida em comum e consequentemente dos seus beijos trocados por décadas.






Há casais que se beijam, pelo processo da rotina, como autômatos, nem parecem sentir a importancia dos seus beijos e a propria necessidade deles tornou-se ato cotidiano, fazendo parte do roteiro previsto na correria do dia a dia.






Os chamados beijos inesquecíveis, estes nos acompanham a vida inteira, quem não os tem por aí seja em sonho ou lembrança, atentando para os que já vimos e revimos em cenas cinematográficas ou novelas sublimadoras de solidões e abandonos pessoais. Muitas vezes ver um beijo de amor, numa cena deliciosamente bem estruturada, parece lavar a alma de quem anda carente de beijos reais…






Solteiros e divorciados precisam traçar estratégias para descolar seus beijinhos avulsos, e o conseguem, com artimanhas de pequenos encontros, conquistas, bailinhos de clubes, etc. Tudo perfeito e plausível.






Nos carnavais, nos permitimos, claro que alguns de nós, nem todos somos iguais, trocar beijos com estranhos no auge da folia… e em festas, os jovens chamados “ficantes”, fazem a fila andar e beijam vários parceiros numa só noite…






Nada a julgar, apenas constatar que o beijo nunca sai de moda, é o primeiro passo, depois do olhar (então é o segundo?) para que se aproxime de alguém com efetivo encontro de peles e tatos…






Beijar e fechar os olhos. Imaginar-se num mundo de amor e paz… Sem despedidas… Sem egoísmos, sem cobranças, sem depois…






Ficar sem beijar..Ficar sem falar. Fechar a boca.. Fechar-se aos beijos. Trancar o coração, abaixar os olhos, beijar só na saudade, e seguir vivendo, também pode ser uma escolha, uma fuga, uma decisão, um pós-trauma, um desgosto, a sensação que ninguém mais nos beijará daquele jeito…






E quantos de nós, ao entrarmos na velhice, solitários e resolvidos, voltamos a ser BVs? Parece engraçado? Pois façam uma pesquisa, há mas pessoas vivendo sem beijos na boca do que se pode imaginar… sobrevive-se, sim, verdade…






Como se vive sem um beijo na boca? Vive-se da saudade dele ou do esquecimento dele…é válido… o que pode doer é viver com desejo dele, sem se atrever a permitir-se correr atrás, dar-se uma chance…






Porque o sentimento pode assumir outras dimensões, beija-se a alma em pensamento, faz-se trabalho voluntário e caridoso, abraçam-se os necessitados de compreensão, atendam-se nossos vellhinhos, distribuam-se beijos na testa, confortem-se os sofrimentos alheios, e a vida segue…muitos casais trocam beijos na boca em homenagem a uma vida que sonham…






Quem vive sem eles, mesmo sem dar ou receber mais beijos na boca…é indispensável recordar o bolero e pedir “besame mucho” como se fora esta noche la última vez”…






Cida Torneros, jornalista e escritora, mora no Rio de Janeiro, onde edita o Blog da Mulher Necessária

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