Bons ventos a trazem, sempre, ao céu da música popular brasileira. Sua voz e interpretação nos acompanham, há décadas, com os dons da ressurreição, aquela certeza inconfundível do quanto esta artista é mesmo iluminada. Maria Bethania é patrimônio nacional, é uma consquistadora, sedutora, tem qualquer coisa de sagrado na sua aura pré-destinada a encantar ouvidos e corações, espalhados no mundo todo. Claro, ela venceu mais uma vez, destacando-se como a grande homenageada na festa da música do Brasil, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.
Um dia, eu a vi, pela primeira vez. Era 1970, ela atravessara a baía de Guanabara para se apresentar no Diretório Acadêmico da Universidade Federal Fluminense. Eu era aluna de Jornalismo, fui com a turma assistir, vi uma jovem magricela, calças brancas, cabelos presos em coque na nuca, muitos colares, descalça, movimentando-se no palco, com tanta força e garra, que, além de me comover, parecia que me revirava por dentro, era um escândalo aquela interpretação de Carcará. Furacão baiano, era pegar ou largar. Peguei!
Dali em diante, virei "tiete", acompanhei sua carrreira, tinha a companhia da minha amiga Marion Monteiro ( Bombom) para nos embevecermos, juntas, muitas vezes, sentadas no chão do Teatro da Praia, em Copacabana, e vê-la impregnar nossas vidas de uma energia incomparável. São tantas histórias que guardo dela, em minha vida, pequenos relicários com as mensagens que a Betha me passa, e que, tenho certeza, alcança milhares de seres que se envolvem com sua voz, suas canções, os poemas declamados, o sorriso maroto, os cabelos esvoaçantes, os pés desnudos, olhares misteriosos, instantes de enlevo e reflexão, puro sentimento, ou seja, arte no sentido lato-sensu, sem tirar nem pôr.
O mano Caetano, este é um fiel escudeiro, talentoso sim, compôs no exílio "Betha, Betha, Bethani, please send me a letter", e tantas homenagens ela merece, claro, é uma cantadora que nos enche de magia, ela é feita na Bahia, é cheia de encantos, pudera, é filha de Iansã, é filha da mãe Menininha, ela é tudo isso e mais alguma coisa.
Era um domingo entardecendo, eu nem tinha lido o jornal, há poucos anos, então, um anjo de plantão me mostrou no segundo caderno, lá pelas seis da tarde, que ela se apresentaria, em fim de temporada, naquela noite, no Canecão, com o show Maricotinha.
Deu-me um arrepio, liguei para a casa de shows, reservei um dos poucos lugares que sobravam ainda. Vesti-me na correria. Tomei um táxi, desde Vila Isabel, pedi pressa ao motorista, cheguei lá, acomodei minha ansiedade de adolescente madura, ela surgiu, eu revivi tudo, uma vida inteira de segredos em torno da sua arte.
Mais uma vez, "peguei" Bethania, como costumamos todos, pegá-la no "tempo, tempo", ela é atemporal, ela continua sendo a melhor pegada musical confirmada, mais uma vez, na festa da nossa canção brasileira. Salve Ela!!
Cida Torneros
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