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Maracanã
terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
La Paloma - curiosidadee sobre a história desta música...( do site Humboldt)
“La Paloma” é cubana
O hit brega global. Nenhuma canção foi cantada tantas vezes pelo mundo afora. Por quê?
Estar em Hamburgo, na Hans-Albers-Platz, deixa Sigrid Faltin quase muda. “Isto tem para mim um significado bem maior do que eu pensava”, diz a graciosa cineasta com penteado à la garçonne, e acrescenta cerimoniosamente: “Como se eu tivesse finalmente chegado lá”. Num passado que se transformou em seu futuro.
Hamburgo, St. Pauli – este local representa como nenhum outro a canção “La Paloma”. E, de repente, dá para ouvi-la realmente de dentro de um boteco típico do bairro. “La Paloma, ohé!”, cantarola um vagabundo urbano que ficou ouvindo o que Sigrid Faltin contava sobre a mais marítima de todas as canções, “uma vez nós temos que partir”.
O nosso Freddy, diz o homem, ainda sob os efeitos da cerveja, e depois ele continua a pôr em ordem sua coleção de cartões-postais com motivos batidos de Hamburgo, pensando presumivelmente em Freddy Quinn, o mais popular dos intérpretes dessa canção na Alemanha.
Sigrid Faltin inspira profundamente: de alegria, de alívio, de orgulho. Durante anos de sua vida, a cineasta viajou atrás da canção sobre a pomba branca, atravessando três continentes, pesquisou a sua difusão, cavou atrás das suas raízes, indagou a respeito de sua alma, procurou os seus intérpretes. Em Hamburgo, o cantarolar do vagabundo sentimental comprova três teses simultaneamente: A velha melodia, mesmo depois de passada meia eternidade desde o seu surgimento, continua proverbialmente na boca de todos. A “protossonata do pop”: assim a definiu certa vez o jornal die tageszeitung, e com razão. “La Paloma” é conhecida no mundo inteiro, amada para além das fronteiras culturais e foi interpretada centenas de milhares de vezes.
Esta habanera que se assemelha a um tango, nascida da pena de um globe-trotter basco, é algumas vezes canção de amor, outras, canção de protesto ou hit, às vezes hino nacional, marcha fúnebre ou música de casamento, às vezes shanty, música de filme ou canção de ninar, às vezes tem funções oficiais, é insignificante ou cheia de dignidade. Em quase todas as áreas linguísticas “La Paloma” tem algum significado, mas, em toda parte, ela exprime aquela comovente mistura de saudade, vontade de ser livre e nostalgia que a torna imortal. Há exatamente 150 anos, assim diz a lenda.
A cineasta Sigrid Faltin teve que procurar muito até encontrar um musicólogo que pudesse dizer-lhe quando surgiu esta canção. Em Cuba ela encontrou Helio Orovio, que lhe contou que “La Paloma” foi criada no ano 1858, aproximadamente pelo menos. “Sebastián de Iradier a compôs entre 1850 e 1860”, explicou o musicólogo Orovio, com séria expressão de pesquisador, no documentário rodado por Sigrid e intitulado “La Paloma – A canção. Saudade. No mundo todo. E dessa forma, o filme e o livro correspondente se tornam rapidamente edições jubilares. “Esses 150 anos são simplesmente muito prováveis”, diz Faltin.
E Helio Orovio ainda conferiu à peça uma nacionalidade. “La Paloma”, ele disse, “é uma cubana.” Isso parece, de fato, algo lógico, embora no filme e nas pesquisas não haja unanimidade a esse respeito. Porque, no fim das contas, algo que tem uma hierarquia mundial produz, como é frequente, cobiças regionais. “Eu não conheço a história da sua canção”, diz com calma, no filme, Makame Faki, um músico popular da Tanzânia, de cabelos brancos, “Mas, quando eu nasci, a canção já existia há tempo.” A única coisa que ficou comprovada é que o compositor Sebastián de Iradier, que numa velha versão é chamado apenas de “Maestro Yradier”, viajou pelo mundo a partir da Espanha, e estava em Cuba no tempo em que compôs a canção.
Cinquenta anos mais tarde os catálogos das editoras de música já apresentavam perto de duas mil versões. Quantas são hoje é algo que só se pode pressupor vagamente. O DJ Kalle Laar, de Munique, calcula que entrementes deve haver muitíssimas versões mais. Essa canção é considerada a mais frequentemente interpretada no mundo, e foi escolhida pelos telespectadores alemães em 2003 como “a canção do século”. Uma peça de todos para todos.
O DJ de Munique compilou durante os últimos anos perto de 150 canções para a editora Trikont, e dois novos CDs saíram durante o ano do jubileu [2008]. Na sua coleção de discos há bandas de rock, combos de tambores de aço, sopranos e tocadores de realejo, assim como estão Laurel Aitken, fundador da música ska na Jamaica, os Coros Fischer, populares na Alemanha, o cantor belga Helmut Lotti e o humorista Karl Dall.
Quando Kalle Laar põe esses discos para tocar, sopram às vezes os ventos das planícies pela sala, como na canção dos Harmonica Playboys, ou ruge a tempestade, como com o grupo de rock The Pesticles. Em outras versões – como a de Liselotte Malkowsky – tocam mil violinos com som cinematográfico, e Bill Ramsey apresenta a canção como se fosse música de revista. Klaus Wunderlich mistura o som dos antigos sintetizadores Moog e The Humpbacks, absurdos cânticos de baleias. O conjunto de sopros de música ferroviária Wiener Neustadt a interpreta com trombones e trompetes, e uma intérprete desconhecida a toca na harpa. Na Alemanha tornou-se conhecida no fluxo de um romantismo da Marinha Imperial, famosa graças ao filme de Helmut Käutner Grosse Freiheit Nº 7, com Hans Albers no papel principal, e mainstream com Freddy Quinn, acompanhado geralmente por um acordeão. Quinn, o pseudomarinheiro austrícaco, trouxe inicialmente “La Paloma” para perto das pessoas, para depois sacrificá-la em prol do comércio. Cantava-a permanentemente, em qualquer show de TV, mesmo que a ocasião não fosse apropriada. Imperdoável: cinco anos atrás, Quinn tentou um recorde mundial, com um coro de 88.600 vozes, no porto de Hamburgo. Acertou o disparo e a canção naufragou.
Esse foi o ponto mais baixo, lamenta Sigrid Faltin, “como aquela história da mais longa salsicha assada em Nurembergue”. Porque “La Paloma” é mais do que folclore. Com essa canção exprime-se o desejo de felicidade no caminho de volta aos convidados de uma boda em Zanzibar e se transmitem condolências aos enlutados na Romênia. Já foi hino nacional do México no passado, para agora ecoar como fanfarra de protesto da oposição. Ensina modéstia aos havaianos, amor à pátria aos espanhóis e o uso de velhos instrumentos aos chineses. Elvis a cantava vestindo camisa havaiana, Curd Jürgens o fazia sem saber cantar, e a francesa Mireille Mathieu obteve com ela o primeiro lugar na parada de sucessos alemã.
E quando a lenda do jazz berlinense Coco Schumann conta no filme que ela, por ordens da SS, teve que cantar “La Paloma” diante das câmaras de gás em Birkenau, e mesmo assim continua a tocá-la repetidamente hoje em dia, a aura da canção de Iradier, sua eloquência, seu carisma, se explicam de fato um pouco mais.
Tudo isso Sigrid Faltin quer inspirar em St. Pauli, mas justamente na Hans-Albers-Platz isso agora é apenas parte de um cenário. No “La Paloma”, inaugurado pelo pintor Jörg Immendorf há muitos anos como um boteco típico, quase não se veem alemães entre tantos turistas. O bairro portuário ficou sem alma. E o que lhe aconteceu foi também sofrido pela canção. “Gostaria de arrancar ‘La Paloma’ das garras da breguice que a estrangulam”, diz Sigrid Faltin, desafiante. O filme, seu livro, os discos – isso é pelo menos um começo.
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