Maracanã

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segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Mi Buenos Aires Querido...




Argentina de mi "cuore"


Mi Buenos Aires Querido... cuando yo te vuelvo a ver!
Estou pensando em volver em fevereiro próximo àquela cidade que amo tanto...



É como um reencontro com a própria nostalgia, aquela saudade interna guardada no fundo a alma adolescente, ou talvez o penumbroso gosto de algum beijo de amor que ficou no desejo, sem sequer ter sido dado. Quem sabe o clima da cidade portenha tenha mesmo o sentido psicanalítico do rever-se em branco e preto, uma sensação ímpar de se mergulhar num passado centenário, e surpreender-se no século XXI, com o glamour dos anos dourados do tango, nos idos das décadas de 30, 40 ou 50.


Há qualquer coisa que beira o sentimental e dramático, adentrando-se no Café Tortoni, em plena madrugada e deparar-se com uma senhora aparentando mais de 80, que chega sozinha, pede um sorvete, o saboreia com dignidade impecável, e horas depois, é possível vê-la na av. De Mayo, na parada de ônibus, solene, esperando o coletivo que a devolverá, sabe Deus, a um bairro tranquilo, carregando sua solidão e, ao mesmo tempo, sua corajosa sede de viver, como um exemplo de resolução emocional e independência.

Paira no ar da cidade, o sabor da paixão arrefecida, dos amores mal resolvidos, das traições de amigos velhos, das milongas choradas, dos líderes mortos, das reivindicações idealizadas em passeatas monstruosas, da soberba pose que permite a alguém sentar-se num dos seus muitos cafés, para degustar um copo dágua, um cafezito, ler um jornal, apreciar as calçadas, anoitecer com a metrópole, enquanto se ouve um bandoneón a lamentar o tempo, a ratificar especial cultura.


Quando se volta a Buenos Aires, e o meu amigo Vitor Hugo já me alertara sobre isso, busca-se caminhar e respirar seu ambiente como se sorve um elixir único, com direito a emoção na voz forte e grave de uma cantante como Adriana Varella ou o passo apressado de homens engravatados que correm atrás do prejuízo da era Menen.


Não há como negar o brilho nos olhos dos feirantes em San Telmo, que esbanjam arte e despojamento, o som dos violões nas ruas, acompanhando a voz de cantores que são o povo e garantem a perpetuação folclórica da veia tangueira que contamina ainda os jovens, apesar da era metálica e roqueira.


Ao se ver um lindo moço agradecer a um idoso cantor de rua, logo após a interpretação do tango Uno, tive , de repente a certeza , do porquê voltei a Buenos Aires , pela terceira vez, com a alegria revivida por saber-me envolvida com sua vida não só turística, mas , sobretudo, com o respeito pelas tradições que seu povo nos faz identificar.


No instante em que a cantora, fantasiada de Evita Perón, aparece no balcão da casa de shows, emitindo "No llores por mí, Argentina", a emoção toma conta do público, nativo ou estrangeiro, e um clamor interno se faz sentir. Como ocultar o sentido místico da relação mãe - filhos pobres, que se repete , inclusive, agora, com a eleição da nova presidenta Cristina Kirtchner? Os argentinos parecem buscar pai e mãe , alternadamente , na escolha dos seus governantes, e, e veneram a memória do seu ídolo musical levado por uma tragédia da aviação, Carlos Gardel. Há imagens dele, repetidas, em cada pequeno bar, mas ela estão também em imensos salões, como homenagem ao seu carisma inesquecível.


No futebol, muitos ídolos também exercem papel de sobe e desce no pódium e na rivalidade dos times locais, o River e o Boca, principalmente, alimentam o gosto pela competição e acirram a verve bem italiana, origem dos seus primeiros imigrantes, de espalhafotasas manifestações em torno de lendas vivas, como é o caso de Dieguito, carinhoso jeito dos torcedores chamarem ao polêmico Diego Maradona.



É incontestável que na América Latina, a Argentina busca reaver o lugar de país desenvolvido e estável, e depois, de sucessivas crises econômicas, a invasão de turistas brasileiros arregimenta professores de português, abrindo espaço para um intercâmbio cultural jamais sentido nos últimos anos, de proporções ainda imprevisíveis. Um taxista que nos leva de volta ao hotel depois de uma noite de tango, faz chacota com a tensão da sua canção e começa a elogiar a alegria do samba, o inusitado das músicas de Raul Seixas, e cita letras como a de maluco-beleza.
os quiosques de jornais e revistas sobrevive a figura de Che Guervara, ainda vendido em posters e edições especiais. O médico argentino que seguiu para Cuba, que foi soldado das Américas, que lutou pela causa socialista, assassinado na Bolívia, mostra a cara, risonho, de boina e charuto, com a mesma dignidade dos seus compatriotas como a dizer: - Estou aqui, estamos todos, somos a Latino América sedenta de liberdade, justiça e progresso.


Um passeio pelo delta do rio Tigre e o que se vê é a febre da vida, navegante, em embarcações que levam mercadorias, que entregam pizzas, que dão socorro médico, que vendem sorvete, na cidade insular, reduto de casas de veraneio e de clubes de esportes náuticos, sui-generis, mostrada com orgulho por eles, a turistas do mundo inteiro.


Em Puerto Madero, desafio dos últimos 12 anos, a transformação urbanística de uma área portuária degradada em zona econômica promissora, com frenesi de vendas imobiliárias que fazem hoje do seu metro quadrado o mais caro da cidade, proporciona o crescimento comercial e residencial cuja performance impressiona pois a cidade não só amplia suas atividades, como ganha em beleza e arquitetura marcante, em estilo moderno , como contraponto ao outro lado tão europeu do início do século XX.



As muitas Buenos Aires se complementam, os museus, igrejas, praças, bairros arborizados, restaurantes para todos os gostos, ofertas de bons vinhos e excelentes carnes, as vitrines das padarias exibindo pães deliciosos e empanadas sedutoras, quem haverá de resistir aos seus mistérios e encantos?


Como preconiza a belíssima filosofia do tango Uno, se alguém tivesse o mesmo coração que já deu, poderia dá-lo outravez, e isso torna-se fácil quando se oferece o "cuore" ou parte dele, a uma terra plana e ávida de vida como Buenos Aires, mas, que não se pense em desvendar-lhe todos os segredos, pois não é a-toa que a Argentina possui o maior número proporcional de psicanalistas por quantidade de habitantes, em relação a muitas nações européias. Nos divãs, além dos salões de tango, processa-se a auto-reflexão dos seus mistérios, para que renasçam suas ilusões, eterna e intensamente.

Aparecida Torneros


Jornalista - Rio de Janeiro






Uno


Tango


1943


Música (ir a la partitura): Mariano Mores


Letra: Enrique Santos Discepolo






Uno, busca lleno de esperanzas


el camino que los sueños


prometieron a sus ansias...


Sabe que la lucha es cruel


y es mucha, pero lucha y se desangra


por la fe que lo empecina...


Uno va arrastrándose entre espinas


y en su afán de dar su amor,


sufre y se destroza hasta entender:


que uno se ha quedao sin corazón...


Precio de castigo que uno entrega


por un beso que no llega


a un amor que lo engañó...


¡Vacío ya de amar y de llorar


tanta traición!


Si yo tuviera el corazón...


(¡El corazón que di!...)


Si yo pudiera como ayer


querer sin presentir...


Es posible que a tus ojos


que me gritan tu cariño


los cerrara con mis besos...


Sin pensar que eran como esos


otros ojos, los perversos,


los que hundieron mi vivir.


Si yo tuviera el corazón...


(¡El mismo que perdí!...)


Si olvidara a la que ayer


lo destrozó y... pudiera amarte..


me abrazaría a tu ilusión


para llorar tu amor...


Pero, Dios, te trajo a mi destino


sin pensar que ya es muy tarde


y no sabré cómo quererte...


Déjame que llore


como aquel que sufre en vida


la tortura de llorar su propia muerte...


Pura como sos, habrías salvado


mi esperanza con tu amor...


Uno está tan solo en su dolor...


Uno está tan ciego en su penar....


Pero un frío cruel


que es peor que el odio


-punto muerto de las almas-


tumba horrenda de mi amor,


¡maldijo para siempre y me robó...


toda ilusión!…

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