Epanha, cuida de mim
Espanha, me chama, me canta, me espanta
me encanta e me pranteia, na canção e na saudade
tua misteriosa magia me entontence e invade,
Espanha, me apanha na curva do mar da Galícia,
me embarca no porto rumo a Barcelona, me esvazia
do pote de euforia e me faz dançar em Andaluzia...
Espanha, me puxa e me prende, me fascina e ilumina,
me engana e me mostra teu lado mais duro, tuas dores
que toureias nas praças dos milhares de amores
que se vão, se superam, se matam e renascem, qual sina
dos navegantes buscadores de terras, de mundos distantes,
Espanha, me põe um sinal de bruxaria na testa, me empresta
tua poesia, tua arte, teus pintores, tuas infinitas cores,
me traz de volta ao céu, e me deixes provar do inferno
que tua força maior, terror dos temores, das bombas,
das guerras, os ditadores de mierda, injustiças e abandonos...
Espanha, cuida de mim, de ti mesma, dos teus muitos donos.
Aparecida Torneros
España en el Corazón
A Espanha é uma coisa de tripa.
Por que "Espanha no coração"?
Por essa víscer é que vieram
São Franco e o séquito de Sãos.
A Espanha é uma coisa de tripa.
O coração é só uma parte
da tripa que faz o espanhol:
é a que bate o alerta e o alarme.
A Espanha é uma coisa de tripa,
do que mais abaixo do estômago;
a Espanha está na cintura
que o toureiro oferece ao touro,
é que é de donde o andaluz sabe
fazer subir seu cantar tenso,
a expressão, explosão, de tudo
que sa faz na beira do extremo.
Das tripas fundas, das de abaixo
do que se chama o baixo-ventre,
que põem os homens de pé,
e o espanhol especialmente.
Dessa tripa de mais abaixo,
como escrever sem palavrão?
A espanha é cosia de colhão,
o que o saburrento Neruda
não entendeu, pois preferiu
coração, sentimental e puta.
A Espanha não teme essa tripa;
dela é a linguagem que ela quer,
toda Espanha ( não sei é como
chamar o colhão da mulher).
João Cabral de Melo Neto
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