Maracanã

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domingo, 16 de agosto de 2009

Um ano sem Caymmi ( reproduzo artigo publicado no blog do Zé Dirceu)



11/08/2008 18:00
Aparecida Torneros
Dorival Caymmi, o cara, velejando para o infinito!

Como se não bastasse ele se chamar Dorival, ser baiano, ter fama de vagaroso, saber viver a vida, ter completado seus 94, no dia 30 de abril, bem quietinho, ser o figurão inspirador de uma família de músicos da melhor qualidade, o danado do poeta da canção brasileira, ainda era bonito como a peste.

Como vinho guardado em adega de bacana, ele conservava a textura do olhar conquistador de corações, tem jeito de me encosta que eu abraço, faz dengo na rede de manhã à noite, devia fazer um ciúme de morder a boca, na companheira de dezenas de anos, mas traz o carinho do povo brasileiro impresso na alma que cantará sempre suas letras inesquecíveis.

Tem operário de obra assobiando Marina, enquanto ajeita os tijolos na massa de cimento, o menino que vende amendoim , mesmo sem saber de onde vem aquele estribilho ( ele nem sabe o que significa palavrinha tão sem graça), mas aprendeu a cantarolar..."Eu vou pra Maracangalha, eu vou.', ele lembra do Maraca...e .tome de repetir essa frasezinha tão sonora...

A manicure do salão do shopping, que anda nostálgica, com saudades da sua terra, choraminga: "Ai, que saudade eu tenho da Bahia Ai, se eu escutasse o que mamãe dizia'Bem, não vá deixar a sua mãe aflita A gente faz o que o coração ditaMas esse mundo é feito de maldade e ilusão' Ai, se eu escutasse hoje não sofria Ai, esta saudade dentro do meu peito Ai, se ter saudade é ter algum defeito Eu pelo menos mereço o direitoDe ter alguém com quem eu possa me confessar "...

Mas, o que me intrigou deveras, foi aquele garçom, provavelmente machista, em dia de domingo, num canto , sussurrando pra si mesmo: "Marina, morenaMarina, você se pintou Marina, você faça tudo Mas faça um favor Não pinte esse rosto que eu gostoQue eu gosto e que é só meuMarina, você já é bonitaCom o que Deus lhe deu Me aborreci, me zangueiJá não posso falar E quando eu me zango, Marina Não sei perdoar Eu já desculpei muita coisa Você não arranjava outra igual Desculpe, Marina, morena Mas eu tô de mal "

Caymi é o povo. O povo é Caymi... O pescador tem Caymi no canto dos ventos... na quebrada das ondas..

A Bahia exportou Caymi pra o mundo...sem dó nem piedade, e ele anda por aí, devagar, bem devagar, compondo, talvez , tomando água de coco, com certeza, mas, dormindo na rede, isso é o mais sensato, porque ninguém é de ferro, e, aos 94, Caymi, eternamente, é de algodão doce... cabeça branquinha e alma de menino eterno. Ele é o cara! O baiano-carioca que amansa o coraçãol da gente, mesmo na hora da partida.

Foi o menino Dorival que com a simplicidade do homem sábio disse: "O mar quando quebra na praia, é bonito...é bonito... "

Bonito é você, Dorival, bonita foi a sua vida, bonita é a sua família, bonita é a sua alma brasileira, e mais bonito que tudo é o seu jeito de ser assim, quietinho, emocionando a gente, fazendo de conta que não está nem aí, pra hora do Brasil! Bonita é a sua subida pros mares do céu bem azul!

Quietinho, com voz de canção de ninar, lá vai você velejar no infinito, e leva a nossa saudade eterna!!!

Aparecida Torneros é jornalista e trabalha na Empresa de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro (EMOP)

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