Maracanã

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terça-feira, 17 de março de 2009

Intervalo amoroso, café na cama, o hawaí é aqui...3 poemas


Reflexões, quadro do pintor espanhol Vicente Segarra





intervalo amoroso

internou-se numa clínica
precisava desestressar
queria esquecer amores frustrados
tornara-se cínica
confundia o tal verbo amar
conjugava-o com gestos estudados
não decidia nada a não ser esquecer
tudo devia ser posto de lado
até o sentimento mais nobre
foi assim que buscou ajuda
nos profissionais da mente
quem sabe o quanto mente pra si
quem sabe o quanto sente pena de si
quem sabe o quanto renega o beijo em si
quem sabe o quanto adia o pingo no "i"...
era a hora do intervalo
entre o fosso do amor ausente,
da saudade de dias felizes, do falo...
falo dele... com ternura... pequenino falo
pequena fala de paixão perdida no espaço...
quem está no seu lugar, por que nao faço
para a sua memorável história uma ode?
mereceria..sim...ele mereceria até um livro,
talvez um relatório, um espitáfio, pode?
aqui jaz o instrumento que em algum momento
me pertenceu, embora flácido, agora,
já me foi de grande valia, já me foi um bem...
talvez não tenha sido bem assim, tenha sido menos...
mas, está ali para esquecer... botar fora...
como a lama que acumulou no leito do rio,
precisa limpar a natureza degradada, por drenos...
deixar que saiam líquidos inférteis, olhar o céu...
caminham , todos, caminham, na casa de repouso...
descobre que precisa de um pouso...
como a águia guerreira, precisa mesmo de um ninho...
onde descansar da loucura da busca insana...
daí, que não é nada mau se deliciar com a paz
para com tudo, aguardar por um dia sem esperas,
de palavras, carinhos , mentiras ou mesmo de compreensão...
aí está esta senhora inquieta a se reciclar, inteira,
observa a natureza que a abraça ainda,
e pede por uma parada obrigatória, uma concessão...
interrompe o vôo, baixa a guarda, busca o pouso...
se dá conta da sua necessidade de um intervalo amoroso...
Cida Torneros
em 14 de outubro de 2004



café na cama

fomos ao cinema
a dona da história escrevia sua novela
horas antes, fui ao analista
tentei voltar.. e voltei
ali, confessei que tenho o medo de me apaixonar de novo...
pedi seu ombro, caso venha a chorar por outro amor perdido...
ele me olhou... me analisou...porque é um analista...rs
depois do cinema...
fomos jantar...
depois do jantar...
fomos a casa da minha história interrompida...
juntei os capítulos..misturei todos, na verdade...
depois da visita a casa que se reforma...fomos ao apartamento...
apartaram-se os laços dos abraços...e fomos tecendo linhas de pensamento...
um calor me subiu como acontece quando me faço dona dos meus sentidos...
fomos para a cama...
nos entranhamos... nos estranhamos...nos embrenhamos pelo desconhecido...
adormecemos...
o sol nos pegou na manhã acariciando corpos satisfeitos...
nos prometemos ser amigos... ainda que isso seja impossível ser prometido...
pois o mundo gira e afasta amigos por tantas vezes...
fiz o café...
trouxe a bandeja pra cama...
dei bom dia...
nos despedimos...
prometemos caminhar na manhã de um amanhã, se houver...
lembrei do analista... o seu ombro está lá...se eu precisar...
agora, todas as quartas, as 19 horas.... tenho um ombro que me aguarda...
alguém está de partida...
alguém promete chegar.....
alguém está de saída...
alguém promete voltar...
preciso mesmo escrever esta história de novo...
cida torneros

O Hawai é aqui

Se a gente surfar,
pega na onda, pega leve,
quando a marola for bem forte,
solta o grito dos pegadores de onda,
no tubo,de um mar revolto,
mistura a espuma com a gota dágua da traição
ronda cada corpo mole que a gente faz
na madrugada no Hawai, que pode ser aqui...

Se a gente surfar, voar no mar sem amar no entanto,
apesar de nem se permitir dominar o luar de luz difusa,
em mente confusa,
se pode pensar em tentar vencer o desafio
se equilibrar na crista da onda...

Se a gente puder, ainda assim sem querer,
se quiser, em momentânea procura,
encontrar na braveza do oceano,
aquela mistura de placidez aparente
com maremoto envolvente...
Se a gente ceder ao desejo profano,
ao sonho absurdo de surfar no Hawai,
pode até se enganar,
se afogar e se perder na loucura de amar...
Se a gente acordar, três horas depois, e nada houver...
Não tem importância porque amar e surfar são a mesma coisa...
Aí, é só tentar se manter sem cair na armadilha do mar,
do amor, do luar, sem amar, sem se dar...

Se a gente esquecer que o Hawai é aqui,
também não tem importância porque aqui também é o Brasil...
dos surfistas dos mares mortos,
dos homens mortos-vivos,
dos amores que partem e não voltam nunca...
cida torneros

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