terça-feira, 8 de abril de 2014

"um sorriso como presente de Natal"‏


Os Natais andam chegando depressa demais, comentou uma amiga minha, nessa corrida louca que passa por nossas vidas entre tantas crises e parece que estamos todos à beira de um ataque de nervos, como define Almodovar no seu clássico filme sobre essa coisa de não nos reconhecermos como seres ainda capazes de gestos desprendidos, desprendidos do consumo. Resolvi então que mandaria de presente para os amigos, familiares e afins, um sorriso de presente de fim de ano. Pus no meu blog e saí distribuindo. É o presente mais barato que encontrei e o mais sincero que consegui, porque se encaixa, nem precisa de fita dourada ou papel colorido, ele já vem embalado na promessa-contextual-fotográfica de que lhes desejo paz, alegria, prosperidade, um montão de fons fluidos através da minha boquinha sorridente, tentando afastar maus presságios, dando uma pausa para os desafetos e apostando na positividade da energia do bem. Desses Natais corridos quase não se pode guardar mais aquelas lembranças de famílias conversadeiras em ceias sem muita pompa, mas com excesso de agrados típicos. Era a bisavó a fazer as rabanadas, nem pensar em compraá-las prontas, ou seriam os bolinhos de bacalhau com o tempero materno, as saladas de frutas tropicais descascadas e picadas a oito mãos pelos agregados que apareciam nas nossas casas e eram sempre benvindos. Natais com presépio armado com a ajuda dos meninos e menias, invenções de galos a cantar no alto de alguma montanha concebida em jornal amassado, pintado, de massa verde, ou um laguinho feito com o espelho emprestado da bolsa da irmã mais velha. Patinhos de biscuí nadando na superfície espelhada. Luzes penduradas em árvore que alguém trouxe do jardim, uns pacotinhos imitando presentinhos, bolas coloridas penduradas, a estreva dalva no alto em ponta como um cometa que passava devagar. Era preciso nortear os tres reis Magos, eles viriam do oriente devagar para presentear o menino Deus, e chegariam no dia 6 de janeiro. Aí, era dia de trocar presentinhos simples, como um sabonete ou uma caixinha de talco, um lencinho com letra inicial de nome bordada em azul, talvez um chinelo novo para o avô, ou um xale de lâ para a avózinha. Crianças ganhavam carrinhos de madeira, bolas de gude, bonecas de pano, nem tinha tanta propaganda, nem dinheiro, nem televisão anunciando ofertas de eletrodomésticos. O máximo que se gastava, além das comidas, era uma pinturinha na fachada, para agradar os vizinhos, e recebê-los no brinde da hora santa. Rezava-se pelo bem da humanidade, pela saúde das pessoas e pela paz dos povos, era um tempo tão ingênuo, ou tão desprovido de ambições. Cavalinhos de pau e velocípides rudimentares podiam ser vistos na manhã do dia 25, adestrados por meninos felizes, e as garotas lá estavam a desfilar suas bonequinhas em forma de ternura materna, enquanto se preparavam para a vida que viria as tornaria mães de verdade, sem pressa. Pois é, minha amiga tem razão, tudo passou tão depressa e cá estou, chegando aos 65, observando a crise, e vendo como as pessoas terão que reaprender a dividir e gastar pouco, fazer da simplicidade o melhor dos seus mundos em Natais vindouros, estes sim, que virão mais vagarosos, pois não há mais porque correr atrás de um ouro derretido com a ganância dos grandes, que pensavam se eterno seu poder de compra. Agora, que reinventem felicidade sem ser e viver. Chega de pseudo felicidade em ter e consumir. Basta reunir quem se ama e abraçar bem forte. Um abraço, um beijo e um sorriso, estes sim, podem ser os melhores presentes do Natal da crise, por isso já enviei minha oferenda despretenciosa e nem quero resposta. Aprendi a ser feliz só por isso: desacelero meu fim de ano e busco a Paz maravilhosa que é amar a quem precisa ser amado, ou melhor, sorrir para quem precisa receber um sorriso de Natal.

Aparecida Torneros Jornalista Rio de Janeiro

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