Dirceu deu show no ‘Roda Viva’

                                          Maria Aparecida Torneros*
     Noite de segunda imprensada no feriadão. Chego do cinema, fui ver a Felicidade Suprema, belo título, mas o filme,apesar de lindas cenas que me trouxeram de volta um Rio de Janeiro romântico e nostálgico, não me entusiasmou. São mais de 22 horas, o telefone toca e é minha mãe, de 84 anos, dizendo para eu assistir o Zé Dirceu, no Roda Viva, que está no ar. Em seguida, ligam mais duas amigas, com o mesmo recado, e lá vou eu, mais uma vez, observar o personagem, o tal que a mídia crucifica nos últimos anos.
Lá está ele, no meio da roda, impávido, bem arrumado, sendo bombardeado, acaloradamente, por um grupo de jornalistas expressivos que parecem organizar as “pegadinhas” do Faustão, e tentam de tudo, para vê-lo escorregar nas cascas de banana que interceptam na sua fala, aliás, atropelam, falam todos ao mesmo tempo, parece uma catarse de grupo, ouve-se bordões, jargões, palavras se repetem, “mensalão”, a importância do PT, a eleição da presidente Dilma ( no dia anterior), o futuro da sua vida pessoal e política, pegan-no no pé, questionam como sobrevive, veladamente, parecem zombar da sua afirmação de que é um consultor, postam-se como se constituissem um tribunal e “quase” julgam-no, ali, aos olhos do povo.
Já cantava o Chico, “tem dias em que a gente se sente, como quem partiu ou morreu, a gente vai contra a corrente, mais eis que chega a roda viva e carrega o destino”.. pra onde? perguntam os questionadores. Para que lado vai o Brasil? O ex-ministro explica suas posições políticas já bastante difundidas com mil versões, fala dos artigos que publica, da sua relação com o presidente Lula, ele conta episódios da  sua história quase virando lenda, mas não se furta a sorrir, não se deixa dominar pelo clima intempestivo de alguns dos perguntadores que detonam verbalizações folclorizadas do que vem a ser a construção de um “judas midiático”, que se defende, tanto judicialmente ( ele faz questão de reafirmar o quanto espera sua absolvição no Supremo) e que segue fazendo política, sendo militante do seu partido, sem esconder de todos que isto é lícito, direito este que não lhe tiraram, apesar da cassação para concorrer a qualquer mandato por enquanto.
Os jornalistas se colocam como espectadores, leitores, formam o bloco cuja opinião também sofre as consequencias de uma longa campanha disseminada em cima de notícias veiculadas com frequência, como diz o entrevistado, um verdadeiro julgamento promovido pela tal mídia e uma cassação que ele classifica de política, por motivos que ousa externar em dado instante: talvez  para tirá-lo do quadro sucessório, quem sabe?
Fato é que a jornalista Marilia Gabriela, o escritor Augusto Nunes, o representante da revista Época, e outros mais, pareciam querer falar e perguntar tudo ao mesmo tempo, atropelavam-se em palavras, olhares, sorrisos, reclamações, considerações, diante de um Zé Dirceu veemente, concentrado em respostas prontas, fiel a  princípios partidários, ideológicos, como um soldado bem treinado, o entrevistado não se deixou levar pelo clima confuso e conduziu sua performance para  um ponto de equilíbrio onde foi capaz de oferecer explicações para seu destino de sobrevivente na roda viva da política nacional, permanecendo no centro da discussão, sem mandato, sem cargo político, fenômeno este, que infelizmente, os participantes jornalistas praticamente não abordaram.
Houve até quem questionasse o uso de helicópteros na campanha do seu filho, a Deputado Federal, no Paraná. Havia, por parte dos profissionais uma sede de “pegadinha”,   e parecia que nenhum tinha lido os autos do processo ( que na vida do entrevistado é fundamental atualmente) no qual o Zé se empenha em se defender e brada sobre a falta de provas, sobre sua inocência, sobre a possível injustiça de que se diz vítima.
Imaginando que a audiência do programa tenha atingido bons índices, é possível detectar que no ” day after” à  eleição da Dilma, uma figura como o Zé Dirceu tem seu papel inegável na história das eleições presidenciais, nas recentes décadas, e desta vez, nem se pode esquecer disso, foi lembrado por um dos jornalistas-perguntadores-julgadores: -  Zé, você poderia agora estar sentado na cadeira que a Dilma vai sentar, em que momento isto se perdeu?
Mas eis que chega a Roda Viva e carrega o destino do Zé Dirceu para um programa de televisão. Mais um, talvez um dos mais expressivos onde ele, ao final, fez um balanço sincero, deixou-se contaminar pela certeza de que continua no centro da roda, alvo das atenções, auge da polêmica, diante do respeitoso público.
*Maria Aparecida Torneros é jornalista.