Maracanã

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terça-feira, 28 de abril de 2009

O silêncio da mulher que se foi


O silêncio da mulher que se foi

A mulher que morava na minha casa tinha alegria, ela sorria ... Eu gostava da sua gargalhada sonora porque me induzia a acreditar que era mesmo feliz... Ela até dançava enquanto arrumava os pertences dispersos, tantos lenços coloridos, brincos de alegorias fulgurantes, anéis de pedras faiscantes e colares tao compridos... Aquela mulher fazia um barulho estranho quando suas saias roçavam pelas pernas... dava uma reaçao meio nervosa em mim... como quando se roça um fio de lâmina, e repercute nos dentes um estado indefinido ... A menina que vivia dentro dela, essa entao, era mais doidinha, pulava como cabrita, bailava a salsa, a rumba e o merengue, perdia o controle dos quadrizinhos que rodopiavam como mola adestrada, e da cintura eu podia ver um zigue-zague digno de tomada de desenho de Walt Disney... Mas a mulher que morava na minha emoçao, ela se foi... um dia... e nem me preparou... quando percebi, lá ia a pobre, já bem longe, a passos largos, corria mesmo... parecia fugir de mim, da minha morada... carregou a felicidade com ela, a ingrata, roubou-me a sensualidade dos gestos, deixou-me a língua sem gosto e os braços sem atitude de afeto... Ainda vociferei um grito enorme, chamei seu nome, bradei : Volte minha Alma de Fada Feliz, volte pra mim! Berrei: não me abandone assim, criatura, que nao saberei viver sem as ilusões dos momentos de deliciosas loucuras e festas que me induziste a viver... Ela sequer respondeu, apressou a caminhada, nem me ligou, estava mesmo dissociada da minha morada, nãao mais habitaria meu lugar, abrindo mão de ser uma bruxinha encantadora... Resolvi silenciar e nunca mais chamar por ela... meu silêncio ( junto ao dela ) é mesmo um adeus ao passado que apenas representou tentativas... Ela tentou me apresentar um plano irreal onde os duendes cantam enquanto os seres humanos fazem amor... nesses poucos dias, sob feitiço dos brabos, meu corpo confundiu-se em gozos absurdos, maravilhosos... ela partiu carregando o dom de me fazer parar o tempo... Nao me falem mais dessa mulher, ela se foi pra sempre.. e só me dói saber que tenho dela ainda um dos lenços coloridos, o vermelho de rosas estampadas, com o qual cubro meu rosto para que ninguém leia nos meus olhos minha inquietante sede de amor...
Aparecida Torneros

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