Maracanã

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quarta-feira, 25 de março de 2009

Nos meus tempos de violonista...


Fui uma aprendiz de violão clássico. Estudei durante uns dois anos, entre os 16 e 17 anos, treinando diariamente a escala e indo às aulas no Conservatório Brasileiro de Música, duas vezes por semana. Ir pelas ruas, carregando o violão, me deixava com a sensação de ser uma futura violonist. Mas, fui traída pela minha baixa aptidão para o mister, e desisti um dia, provavelmente na certeza de que seguiria sendo grande apreciadora dos virtuoses, entre eles, um brasileiro chamado Darci Villaverde, que conheci numa travessia Rio-Niterói, na barca da cantareira.
Tivemos uma conversa de tocadores de violão, mostramos os calos nos dedos, ele devia ter uns quarenta anos, admirou-se do meu interesse pelo instrumento em versão erudita, numa época em que as bandas de rock e a bossa nova eram moda para a garotada. Nem soube explicar. Mas pude fazê-lo sentir que era só um pequeno sonho, pois por mais que treinasse nunca chegaria a tocar como ele. No fim da viagem, pediu meu endereço, e uns meses depois, revebi dele um cartão postal, de Berlim , tinha se apresentado na Alemanha Oriental, e se lembrou da garota magricela que aprendia a música de violão sofisticado. Nunca mais ouvi falar dele. Mas consegui um disco, muito anterior ao advento do cd-player, com interpretações dele, magníficas e até hoje recordo seu rosto simpático naquela tarde em que o acaso nos fez sentar um ao lado do outro e conversarmos, descobrindo a afinidade momentânea dos dedos calosos pelas cordas de metal, desfiadoras a produzir sustenidos e bemóis que me deixavam doida ao ler as partituras. Mistérios da vida, coisas que vamos juntando no armário das lembranças, pequeninas alegrias proporcionadas pelos deuses conspiradores.
Agora, remexendo gavetas atulhadas de velhos retratos, encontrei um, já comido pelos fungos, que me atrevo a escanear para observar meus sentimentos tão antigos. Ali, na saleta da casa da minha adolescência, está um móvel que continha a televisão, a vitrola, o rádio e o lugar dos long-players. Eu, vestida de azul, sapatos de verniz preto, me posiciono para uma pequena apresentação familiar, na festinha dos meus 17 anos. Há no meu entorno uma aura de promessa e futuro, uma alegria dividida entre inúmeros projetos para os próximos anos. Passada muitas décadas, ainda guardo o velho violão, comigo, presente do meu pai querido. Mas, as canções que um dia cheguei a tocar, em sua maioria, me escaparam da memória, e meus dedos, deixaram os calos para trás, embora a emoção ainda me pegue ouvindo, internamente, o som da minha juventude esperançosa e sonhadora. Bom rever essa foto e me reconhecer feliz, apesar dos tempos difíceis que enfrentávamos, já que a mocidade me brindava com sua inquietação e desafiante corrida ao novo. Hoje, o novo virou passado, e, a menina-moça que a fotografia deixa entrever, já não é tão moça, mas conserva o coração menino que se encanta com a música para sempre...
Aparecida Torneros

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