Amigos e amigas, um "viva" a Portugal!

Amigos e amigas, um "viva" a Portugal!







Na vida, de todos nós, tão misteriosa, curta e cheia de mudanças de rumo, há lugares que nos surpreendem por serem tão familiares, mesmo que ali nunca se tenha vivido, verdadeiramente, mas que, através da história, da ancestralidade e da mídia, literatura, cinema, esses tais pedacinhos de terra, nos puxassem com suas manhas, traços culturais, canções, paixões e até seus próprios medos.






Em mim, acredito que isto se passe a quase todos, determinadas cidades ou países , por onde tenho passado, marcam até por seus cheiros, luzes da manhã ou da noite e incluo nestes sentidos peculiares e delicados até mesmo euforias populares e nostalgias que percebo em olhares de gente que nem conheço, cujo nome nunca vou saber, mas que me passam suas sensibilidades, ainda que por segundos, quando nos cruzamos nas ruas indefinidas de um mundo tão multifacetado e tão globalizado, como querem os economistas do poder.






E poder implica em manipular, manobrar, interferir na história dos povos e nas trajetórias individuais.






Estive em Portugal, em carne e osso, duas vezes, por enquanto. Estive e tenho estado em Portugal, em alma e coração, milhões de vezes.






Trago no sangue a herança do meu avô português, Antonio Pinto da Silva, pai do meu pai, com quem convivi até meus nove anos, quando o perdi para um ataque de coração, ele tinha 65 anos, era um poeta nato, um bon vivant, um viajante, um ser de fé, homem de brio, me passou alegria e força, gostava de me ouvir contar sobre a vida dos índios brasileiros, tudo que eu, na fala atropelada da minha infância, lhe repetia, misturando termos que lhe faziam rir, que a professora me ensinava. Entre "tacapes", "ocas", "curumins", "pajés", além de muitos outros, tais palavrinhas eram um intercâmbio cultural nas tardes dos anos 60, entre um velho avô luzitano e a primeira neta, espevitada, falante, sedenta de contar e descrever algo que fosse novo para aquele homem que veio de Portugal e no Brasil plantou uma bela família.






Claro que havia troca intensa, eu aprendia com ele muitas coisas sobre Portugal e nem me dava conta disso. O seu falar carregado, os discursos na Igreja, sua atividade diária de trabalho constante, as idas aos bailes de carnaval, as festas que organizava na rua em que morávamos, os almoços que oferecia aos padres, e estes, como gostavam de tomar vinho, eu me espantava.






Menina e observadora, via com memória fotográfica se sucederem os Natais onde ele se sentava na cabeceira da grande mesa e sorria ao ver os 8 filhos reunidos, os netos, noras e genros, o movimento dos talheres, os brindes das taças, as falas simultâneas, e pelas janelas da grande sala da casa que ele construiu no subúrbio carioca, via-se o jardim que minha avó espanhola, Carmen, cuidava, as rosas, jasmins, o lago com peixinhos e até uma figueira e uma videira, mesclando-se ao sabor da saudosa terra além do Atlântico, onde, certamente, frutos e flores lhe traziam o gosto dividido da imigração e da aventura.






Pois só fui conhecer Portugal, quer dizer, pisar em seu solo bendito, já beirando os meus 60 anos. Entretanto, eu me revia ali, já o conhecia na verdade, e apenas me sentia voltando à terrinha com ganas de passear por cidades e me fartar dos seus quitudes. Isto foi em 2009, lá fiquei por duas semanas, seguindo depois para Espanha e França.






No mês passado, dois anos depois, voltei a Portugal, por apenas 5 dias, com minha amiga Katia, depois de passarmos quase tres semanas conhecendo Italia e revivendo Paris, desembarcamos em Lisboa, que ela também já conhecia, mas no fundo, antes de voltarmos ao Brasil, era mesmo naquele lugarzinho especial que precisávamos fechar com chave mestra a nossa ida à Europa.






No coração, a tal sensação misteriosa. Senti-me outravez em casa. Agora, vô Antonio tem um bisneto, o João Luis, que fez o inverso dele e mora, há quase um ano, com esposa e filha, em Massamã, próximo de Lisboa. Fomos visitar meus primos, que estão amando viver em Portugal. No curto período em que lá fiquei, desta vez, acompanhei a eleição do novo primeiro ministro e me envolvi com as faces preocupadas da população portuguesa frente à tal crise econômica que assola a Europa.






Nos últimos dias, as notícias sobre a situação financeira de Portugal, deixam-me triste, preocupada, mas sobretudo, enfastiada, porque o país está sendo injustiçado pelas agências de risco...todos sabemos que a crise paira e tem um quê de fabricação intencional nela...como sempre... nosso amado Portugal não merece ser classificado como "lixo" uma vez que há muitos "coelhos" nesse mato econômico... interesses diversos e transversos, muita intriga e manobra que não leva em consideração a sobrevivência humana dos povos, mas o lucro que o Deus chamado "Capital" globalizado obtem ou quer obter à custa do sacrifício das pessoas que são formiguinhas diante de gigantes insensatos e gananciosos, eu diria até desumanos, inconsequentes e virulentos.






Sabemos que há crise em muitos lugares do mundo, na própria Europa, Irlanda e Grécia, não saem do noticiário, o desemprego leva a juventude assustada às ruas, ao protesto, a desestabilização é péssima para muitos e deve ser ótima para alguns poucos, neste tal universo capitalista, selvagem, ao qual nos acostumamos em doses de contaminação eufórica, via shoppings anestesiantes, taxas e impostos escorchantes, injustas colocações em listas e listas de países que oscilam em suas economias, ao bel prazer de irresponsabilidade dos que só vêem cifras à sua frente.






Os que não conseguem sentir a alma dos povos, os que não percebem as dores das guerras, os que não se inquietam com a fome das gentes, os que não respeitam a história das nações, os que não têm a chance de se emocionar com a essência humana, a estes lhes cabe ( ou resta) trabalhar em agências de risco, em mercados flutuantes, em jogos de impacto, em manipulação da vida alheia, pensando talvez, racionalmente, que seriam os novos Santos do Deus Capital. Pena que suas emoções estejam tão adormecidas. E vamos dar um Viva a Portugal, para que a santa Terrinha supere a história, e se reorganize, porque é seu direito, a partir de uma reciclada geral, para o bem do seu povo, da gente que lhe quer bem e para que dê exemplo ao mundo, como precursor que é, da globalização, quando seus navegantes sairam pelo mundo e conquistaram a Terra, a mesma que hoje quer dar as costas, sem lembrar que há na alma portuguesa, uma sede que ultrapassa mares, uma fome de vencer que vai muito "além da Trapobana", por mares nunca dantes navegados", como cantou Camões.
Aparecida Torneros

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terça-feira, 5 de julho de 2011